Por que ter um editor de projetos numa redação?

Por Ajor jul 14, 2023

Este conteúdo foi publicado originalmente pela Ijnet em 09 de julho de 2023.
Autora: Samanta do Carmo

Nos últimos cinco anos, ao atuar em redações de jornalismo digital no Brasil, acompanhei o desenrolar de diferentes tipos de projetos: realização de eventos, grandes investigações, bolsas de reportagens. Posso dizer que algumas redações apenas distribuem as responsabilidades entre as pessoas mais interessadas em ver aquela ideia sair do papel. E isso é feito sem nenhum método ou processo para guiar a produção. Meu objetivo aqui é compartilhar algumas reflexões sobre a importância da figura de um editor de projetos nas redações.

O editor de projetos precisa basicamente desempenhar os seguintes papéis: garantir que o conteúdo siga a proposta sem ser alargado infinitamente; definir opções que sejam desenhadas dentro de uma margem orçamentária sustentável; fazer a equipe interagir de forma colaborativa. 

Se você se interessa por definições mais detalhadas sobre projetos, eu indico o guia “Gerenciamento de projetos em 7 passos, uma abordagem prática”, do professor Armando Terribili Filho, doutor em Educação pela Unesp, mestre em admistração de empresas pela Fecap. O livro me acompanha há alguns anos e já me ajudou desde tirar ideias mirabolantes de pauta do papel até inventar modelos de relatórios narrativos para apresentar a parceiros e apoiadores.  

Pauta agora é projeto?

Pauta pode e deve continuar sendo pauta para a grande maioria dos jornalistas em seu trabalho cotidiano. Mas para entender em termos práticos: se um repórter ou produtor de conteúdo na redação ganhou uma bolsa de reportagem ou um financiamento para cobrir um tema específico, ele tem um orçamento delimitado para trabalhar, uma data final de vigência da bolsa, quando todas as atividades precisam estar entregues e um tema para trabalhar. Isso é um projeto editorial.

Da forma similar, imagine produzir um conteúdo multiplaforma envolvendo repórteres, editores, designers, ilustradores, roteiristas, produtores de vídeo e desenvoveldores. Manter todos informados, trabalhando na mesma direção e em condições favoráveis – deadlines atingíveis, entregáveis definidos, ferramentas de trabalho adequadas e briefings em dia, por exemplo – pode ir além do que é possível para o papel tradicional de editor. O editor de projetos pode ter um papel central para o sucesso deste tipo de produção multiplaforma. Então, se você atua em alguma posição com certo poder de decisão numa redação, talvez seja hora de pensar pauta também como projeto.

Recentemente visitei a redação do The Washington Post e conversei com o editor de Américas, Matthew Hay Brown. Ele destacou a vantagem de trabalhar em conjunto com o editor de projetos, lidando com toda a agenda de reuniões e comunicação entre as equipes, para tirar do papel contéudos com propostas visuais imersivas. Ele citou como exemplo a produção Destroying Maya treasures to build a tourist train, publicada em dezembro de 2022.        

A melhor maneira de usar cada recurso

Redações estão trabalhando cada vez mais com editais de bolsas de reportagem e financiamentos específicos para uma produção. Pensar um cronograma de um projeto é diferente de traçar uma estratégia de investigação ou de apuração para um reportagem. Projeto exige um ritmo de execução. Apuração vai seguindo seu caminho de acordo com o rumo que as informações encontradas apontam. Como conciliar? Na linguagem de gestão de projetos, manejar o triângulo “escopo, tempo e recursos” é a ferramenta de conciliação. Se o deadline da produção é inegociável, então o que resta é aumentar a equipe, por exemplo, contratando repórteres, designers, ou desenvolvedores assistentes. Isso implica, consequentemente, remanejar ou conseguir mais orçamento. Mas se o limitador é orçamento, a possibilidade pode ser reduzir o escopo, ou seja, produzir um conteúdo menos ambicioso.

Por outro lado, quando a escolha editorial sobre o tamanho da pauta, sua abordagem e formato não tem margem para alteração, sem ter como gastar mais dinheiro com a produção – o que eu arrisco dizer que é a realidade de muitas redações – o que resta é se contentar com a dedicação parcial da equipe ao projeto sem expectativa definida de quando ele vai ser publicado.

Nenhuma dessas decisões são fáceis de serem tomadas. Ficam menos complicadas se existir uma pessoa com visão geral dos projetos da redação. E a partir daí estar dedicada a esboçar cenários, ouvir as demandas dos envolvidos, estabelecer prioridades e sugerir caminhos.

“Mas isso eu faço todo dia!”

Por fim, o editor de projetos é importante para produzir a documentação do que foi feito. Isto permite que os aprendizados da equipe ao longo de uma produção não se percam pelo caminho e os mesmos erros não sejam repetidos sistematicamente. Há ainda a tal tarefa famigerada para quem trabalha com editais e bolsas, a elaboração de relatórios narrativos e financeiros de prestação de contas. Ela pode ficar muito mais simples se for incluída como uma parte do trabalho do editor de projetos. 

Para quem trabalha em jornais e revistas impressas, talvez seja fácil reconhecer todas essas peças sendo combinadas diariamente ou semanalmente no fechamento. Talvez a função do editor de projetos seja uma adaptação, versão revisada de outra figura-chave na cadeia de produção do jornalismo. Mas se você é um jornalista empreendedor, tocando uma organização de jornalismo digital inovadora e jovem, refletir sobre o papel do editor de projetos, que muito provavelmente é o que você faz no dia a dia, pode ser crucial para aumentar a intencionalidade na tomada de decisão.  

Foto: Canva.

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